Informativo: 638 do STJ – Processo Penal
Resumo: Não se admite a pronúncia de acusado fundada exclusivamente em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial.
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Encerrada a primeira fase do procedimento do júri, denominada instrução preliminar, caso o juiz se veja convencido da materialidade do crime e da existência de indícios de autoria, deve pronunciar o réu, conforme prescrito no art. 413 do CPPArt. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. . A sentença de pronúncia, portanto, é cabível sempre que o juiz reconhecer a existência do crime e indícios de quem seja seu autor, quando então remeterá o acusado para julgamento pelo júri.
Nesta altura, cabe ao juiz singular analisar se os elementos produzidos durante a primeira fase do procedimento são suficientes para demonstrar que o crime de fato ocorreu (prova da materialidade) e que o acusado pode ser seu autor (indícios de autoria).
Ao se satisfazer com meros indícios de autoria, quis o legislador deixar claro que a sentença de pronúncia encerra um simples juízo de probabilidade na qual o juiz julga admissível a acusação, apta, portanto, a ser conhecida pelo Júri. Por indícios, na lição de Borges da Rosa, “se consideram os fatos conhecidos que, por sua força e precisão, são capazes de determinar uma só e única conclusão: a de que não foi outro se não o indiciado o autor ou cúmplice do fato criminoso” (Processo penal brasileiro, Porto Alegre: Globo, 1942, vol. II, p. 494-5). Nem poderia ser diferente. A certeza absoluta deve estar presente quando do julgamento em plenário. Aí sim os jurados devem orientar seus veredictos no sentido de apenas condenarem quando munidos da mais absoluta convicção, oriunda da prova dos autos, de que o autor cometeu o crime. Eventual dúvida se resolve, então, em favor do acusado, com o conhecido brocardo in dubio pro reo. Para a pronúncia, ao revés, a regra é in dubio pro societate, isto é, não se exige, neste momento, a mesma certeza que se faz necessária para condenar. Na dúvida, deve o juiz pronunciar, cabendo ao Tribunal do Júri, com competência constitucional para tanto, dar a última palavra ao julgar o mérito da acusação.
O STJ decidiu, no entanto, que o in dubio pro societate não autoriza que se faça a pronúncia sem mínimos elementos submetidos ao devido processo legal, que, neste caso, é a instrução preliminar, a primeira fase do procedimento do júri.
No caso, o réu havia sido pronunciado com base em apenas um depoimento extrajudicial e na confissão qualificada de um corréu, elementos considerados insuficientes pelo Tribunal de Justiça local e, posteriormente, pelo STJ:
“Desse modo, nota-se a ausência de indícios de autoria delitiva (art. 413 do CPP) submetidos ao devido processo legal. Portanto, carece de judicialização a prova a apontar os indícios de autoria delitiva. Importa registrar que a prova produzida extrajudicialmente é elemento cognitivo destituído do devido processo legal, princípio garantidor das liberdades públicas e limitador do arbítrio estatal. Assentir com entendimento contrário implicaria considerar suficiente a existência de prova inquisitorial para submeter o réu ao Tribunal do Júri sem que se precisasse, em última análise, de nenhum elemento de prova a ser produzido judicialmente. Ou seja, significaria inverter a ordem de relevância das fases da persecução penal, conferindo maior juridicidade a um procedimento administrativo realizado sem as garantias do devido processo legal em detrimento do processo penal, o qual é regido por princípios democráticos e por garantias fundamentais. Assim, não se pode admitir, em um Estado Democrático de Direito, a pronúncia sem qualquer lastro probatório colhido sob o contraditório judicial, fundada exclusivamente em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial, mormente quando essa prova está isolada nos autos.” (AgRg no REsp 1.740.921/GO, j. 06/11/2018).
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