A Primeira Seção do STJ analisou o tema nos Recursos Especiais 1.814.919/DF e 1.836.091/PI, julgados em 24/06/2020, e conclui que a isenção do Imposto de Renda prevista na Lei n. 7.713/1988 (art. 6º, XIV) para os proventos de aposentadoria ou reforma concedida em virtude de acidente em serviço ou doenças graves não é aplicável no caso de trabalhador com doença grave que esteja na ativa.
Eis o dispositivo analisado:
“Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:
XIV – os PROVENTOS DE APOSENTADORIA ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma.”
A locução utilizada é inequívoca: “proventos de aposentadoria”. Assim, por estarmos diante de isenção, devemos realizar interpretação literal. É o que prevê o art. 111, II, do CTN:
“Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:
I – suspensão ou exclusão do crédito tributário;
II – outorga de isenção;
III – dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.”
Ao comentar o art. 111, II, do CTN, Aliomar Baleeiro e Mizabel Derzi (Direito Tributário Brasileiro: CTN comentado. Rio de Janeiro, Forense, 2018, p. 1071) assinalam “o dispositivo em comento veda a integração criativa do direito, para além do texto da norma.”
O art. 111 do CTN não impõe, a rigor, que sempre se empregue apenas o método gramatical de interpretação. Seu sentido, em verdade, é o de vedar o uso de analogia, ou de interpretações extensivas, para estender, pela via jurisprudencial, o alcance da norma sobre hipóteses nela não previstas. A interpretação literal é aquela coerente com os sentidos possíveis do texto, vale dizer, significados compatíveis com o texto legal, que não vão além dele, mas não necessariamente restritiva – MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Código Tributário Nacional. São Paulo: Atlas, 2018.
O STJ confirmou a tese segundo a qual não cabe a isenção prevista no art. 6º, XIV, da Lei n. 7.713/1988 para as pessoas em atividade.
Disse o Min. Og Fernandes, relator dos processos: “Como reza o artigo 111, inciso II, do CTN, a legislação que disponha sobre isenção tributária deve ser interpretada literalmente, não cabendo ao intérprete estender os efeitos da norma isentiva, por mais que entenda ser uma solução que traga maior justiça do ponto de vista social. Esse é um papel que cabe ao Poder Legislativo, e não ao Poder Judiciário.”
Cumpre assinalar, por fim, que antes disso, em 20 de abril de 2020, o art. 6º, XIV, da Lei n. 7.713/1988, foi declarado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 6025/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, decisão que, como sabemos, possui efeitos vinculantes e erga omnes. Em verdade, o STJ só ratificou um entendimento que a estava vinculado.
De fato, conforme a dicção do art. 28, parágrafo único, da Lei n. 9868/99, a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.”
Os limites subjetivos da coisa julgada na declaração de inconstitucionalidade não são controvertidos: sua eficácia é contra todos – BARROSO, Luís Roberto. O controle de Constitucionalidade no direito Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 243. A eficácia erga omnes é própria dos atos normativos de natureza geral, atingindo um número indefinido de destinatários. Por sua vez, o efeito vinculante pode ser definido como proibição de contrariar decisão proferida pelo STF, sendo essa proibição endereçada a outros órgãos estatais – vide DIMOULIS, Dimitri; LUNARDI, Soraya (Curso de Processo Constitucional. São Paulo: Atlas, 2016, p. 191).
A decisão deve ser cumprida pelos “órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal”, segundo prevê o art. 28, parágrafo único, citado acima. O STF não modulou a decisão tomada.
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