No dia 19/10/2022 o STJ editou o Enunciado Administrativo 8/2022, que dirimiu significativa controvérsia processual a respeito do requisito de relevância da questão federal como critério de admissibilidade do recurso especial.
Como é de conhecimento de todos, em 14.7.2022 foi promulgada a Emenda Constitucional nº 125, que introduziu o requisito da relevância da questão federal como requisito de admissibilidade do recurso especial.
Tão pronto foi publicada, instaurou-se uma controvérsia a respeito de sua vigência, especialmente a partir da dicção dos artigos 2º e 3º, da própria Emenda Constitucional 125/2022:
O art. 3º, da Emenda Constitucional 125/2022, por sua vez, dispõe que esta entrará em vigor na data de sua publicação.
Art. 2º A relevância de que trata o § 2º do art. 105 da Constituição Federal será exigida nos recursos especiais interpostos após a entrada em vigor desta Emenda Constitucional, ocasião em que a parte poderá atualizar o valor da causa para os fins de que trata o inciso III do § 3º do referido artigo
Como é regra no Processo Civil, a exigência da relevância da questão federal será cabível apenas aos recursos especiais interpostos após a vigência da Emenda Constitucional 125/2022.
Agregue-se a isso o fato de que o texto constitucional, no art. 105, § 2º, indicou expressamente a exigência de lei regulamentadora:
§ 2º No recurso especial, o recorrente deve demonstrar a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que a admissão do recurso seja examinada pelo Tribunal, o qual somente pode dele não conhecer com base nesse motivo pela manifestação de 2/3 (dois terços) dos membros do órgão competente para o julgamento. (grifamos)
Sempre nos foi evidente que essa exigência processual somente seria aplicável após a vigência da norma regulamentadora, responsável por estabelecer, certamente, os critérios procedimentais e seus efeitos jurídicos (forma de demonstração da relevância; suspensão de processos e distinção de caso concreto; concessões de medidas de urgência, etc), bem possivelmente na mesma trilha já percorrida pela regulamentação da repercussão geral do recurso extraordinário (contida no art. 1.035 do CPC).
A despeito de respeitáveis vozes doutrinárias compreenderem em sentido diverso e de alguns Tribunais de Justiça já terem começado a exigir, de pronto, a demonstração da relevância da questão federal, defendemos em nosso Manual de Recursos Cíveis – Teoria e Prática, a necessidade de publicação da norma regulamentadora para que este requisito de admissibilidade do recurso especial passe efetivamente a ser exigível:
Porém, é necessário esclarecer melhor este ponto: a relevância da questão federal somente será exigível a partir do momento em que advier a norma regulamentadora mencionada no art. 105, § 2º: “o recorrente deve demonstrar a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso, nos termos da lei”.
O instituto da relevância da questão federal, conforme exigido pelo próprio art. 105, § 2º, do Texto Constitucional, não é autoaplicável, pois a redação dada pela Emenda Constitucional 125/2022 menciona, para regulamentação desse elemento processual, que esta será demonstrada“nos termos da lei”.
(DONOSO, Denis; SERAU JR., Marco Aurélio. Manual dos Recursos Cíveis – Teoria e Prática, 8ª ed., Salvador: Juspodivm, 2022, p. 463-464)
Nestes termos, fez bem o STJ em editar o Enunciado Administrativo nº 8/2022, orientando os Tribunais no sentido de que a relevância da questão federal será necessária somente após a vigência da lei regulamentadora.
Com isso, evita-se a instalação de desnecessária controvérsia processual e propicia-se maior nível de segurança jurídica nesse tão relevante tema do exercício da jurisdição excepcional pela Corte da Cidadania.