Se observarmos atentamente, constataremos que o Socialismo (movimento sócio-político) não trouxe apenas ditames/objetivos econômicos, mas revelou, igualmente, a criação de um modelo – até então inovador – de sociedade.
Embora extenso e complexo, vale debruçar, rapidamente, sobre os diferentes “socialismos”, as principais óticas sobre o modelo – diferentes entre si – que surgiram ao longo do tempo.
a) O Socialismo utópico: “socialistas utópicos”, como Saint-Simon, Fourier e Owen, atacaram todas as bases político-econômicas da sociedade existente (onde a burguesia e proletariado conflitavam) e propuseram: (i). a supressão das diferenças entre a cidade e o campo; (ii). a abolição da família, do lucro privado e do trabalho assalariado e (iii). a proclamação da harmonia social e a transformação do Estado em simples administrador da produção. Vale destacar que Karl Marx e Friedrich Engels reconheceram o enorme mérito destes socialistas utópicos, pois foram eles que animaram as primeiras lutas dos trabalhadores na busca da igualdade, da liberdade e da fraternidade.
b) As vertentes marxistas: tanto para Marx bem como para Engels, o desenvolvimento do capitalismo conduziria, inexoravelmente, à luta irreconciliável entre a burguesia e o proletariado. Segundo estes teóricos, a revolução proletária viria a ter lugar nos países capitalistas mais avançados. Sendo assim, esta revolução dependeria, forçosamente, da vontade consciente e da ação do próprio proletariado. Para eles, a revolução não levaria diretamente à uma sociedade propriamente comunista (dependeria de mais fases para se efetivar com sucesso). Para Marx e Engels, a fase socialista acarretaria na extinção das classes e do Estado, na conversão da exploração burguesa para a associação livre e igualitária dos trabalhadores.
O ápice deste processo representaria a passagem para a segunda (e superior) etapa do comunismo.
Constata-se, então, que, nesta fase, posterior, superior, designadamente comunista, o trabalho não seria um meio de vida, mas sim a primeira necessidade vital; o desenvolvimento das forças produtivas criaria uma farta riqueza social, garantindo, assim, o livre e pleno desenvolvimento de todos e de cada um dos seres humanos. Neste diapasão, o triunfo da revolução (proletária) que levaria ao comunismo dependeria, contudo, da cooperação e da solidariedade do proletariado internacional (eis aqui a necessidade da ampliação, no âmbito internacional, dessa revolução).
Fica evidente que esse arcabouço teórico desenvolvido por Marx e Engels forjou a formação e o desenvolvimento dos partidos políticos voltados para a causa das classes trabalhadoras durante a segunda metade do século XIX.
Lembremos, aqui, no que tange aos direitos humanos, o surgimento da sua segunda dimensão (fruto do crescimento demográfico, da forte industrialização da sociedade e, especialmente, do agravamento das disparidades sociais que marcaram a virada do século XIX para o século XX). Ora, com o advento da “consciência socialista”, nasceram as reivindicações populares, exigindo, assim, um papel mais ativo do Estado na correção dos hiatos sociais e das disparidades econômicas, o seja: na busca de maior justiça social. Eis a razão que se intitula esses direitos como “direitos sociais”.
c) a vertente socialista da social-democracia: se desenvolve principalmente no final do século XIX na Áustria e na Alemanha, tendo em vista o surgimento dos partidos de massa que ganharam força nesta região europeia. Buscaram transformar instituições e reformar a velha sociedade burguesa. Com isto, externaram um objetivo claro: a gradual transformação do capitalismo para o socialismo (que ocorreria num tempo indeterminado do futuro).
d) o socialismo leninista: esta concepção é uma teoria científica do desenvolvimento social; descobriu as leis que regem as mudanças verificadas na natureza, da sociedade e do pensamento. Não se limita a diagnosticar a realidade, mas visa a identificar as contradições que determinam e promovem essas mudanças; desenvolve as formas e métodos que servem para transformar a sociedade.
Para Lênin, o partido do proletariado é encarado como uma necessidade histórica real. Sendo assim, o marxismo-leninismo revela-se na sua base filosófica, econômica e política (instrumento para construir o socialismo e o comunismo) – este seria o primeiro requisito para romper a máquina estatal, abarcando proletários e camponeses. Seguindo Marx, ele destacou que a fase que se seguiria à consolidação da ditadura do proletariado seria, de fato, a socialista. Nela, os meios de produção deixam de ser propriedade privada de uns e passam a pertencer a toda a sociedade. Do trabalho – realizado por todos os membros da sociedade aptos a trabalhar e a desenvolver – seriam criados fundos de reservas para repor os meios de produção gastos e para ampliar a escala da produção. Igualmente previa a criação de um fundo social para os gastos de administração, escolas, hospitalar, asilos, etc.
e) O socialismo de Mao e Xiaoping: a sua doutrina baseia-se na manutenção de contradições sociais para justificar a necessidade de uma revolução permanente. Em 1958, Mao lançou um programa conhecido como Grande Salto em Frente – a principal característica do maoísmo foi o reconhecimento da importância das massas camponesas pobres – que era a maioria da população chinesa – e a fé em sua capacidade revolucionária.
Vale destacar que a República Popular da China foi muito mais além das ideias e previsões de Mao. Neste sentido, a contribuição essencial foi dada por Deng Xiaoping (desde finais dos anos setenta e até à sua morte, foi o grande estrategista da modernização do “socialismo ao estilo chinês”). No período que governou (1982-1990), a sua prioridade foi tentar “curar” os traumas abertos pela “revolução permanente” de Mao, (embora preservando o seu estatuto). Deng fez uma adaptação do maoísmo a alguns aspectos das economias de mercado, promovendo a abertura econômica e a modernização do aparelho produtivo.
É importante alertar que as teorias de Lênin e de Mao, com a contribuição de muitos outros teóricos e dirigentes socialistas, estiveram na origem dos processos revolucionários e das experiências socialistas desde a década de 1930 até ao derrubada do bloco soviético.
Vale sublinhar que, apesar da variedade de conceitos de socialismo, tem sido comum a todos a fundamental importância dada à economia na configuração da vida social em geral. A essência do “projeto socialista” (nas suas diversas versões) foi sempre a transformação da propriedade privada em propriedade social, que Marx enuncia como a “sociedade de produtores associados” ou “modo de produção associado”.
Leitura recomenda: “A Revolução Bipolar – a gênese e derrocada do socialismo soviético”, Luís Fernandes;
“Manifesto Comunista”. Marx e Engels.
Questão de concurso:
CESPE – Rio Branco – 2017
Acerca das revoluções russa (1917) e chinesa (1949), dois marcos na história política e das relações internacionais no século XX, julgue (C ou E) o próximo item.
As revoluções russa e chinesa têm em comum o referencial teórico marxista e a prática revolucionária de mobilizar grandes massas do proletariado urbano organizadas pelos partidos comunistas nacionais com o objetivo de tomar o poder com o uso da violência.
Resposta: Errada
O Prof. Alexandre Sanches Cunha escreveu:
Manual de Filosofia do Direito