Informativo: 624 do STJ – Direito Penal
Resumo: O delito previsto na primeira parte do artigo 54 da Lei n. 9.605/1998 possui natureza formal, sendo suficiente a potencialidade de dano à saúde humana para configuração da conduta delitiva.
Comentários:
O art. 54 da Lei 9.605/98 pune a conduta de causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora. A pena é de reclusão de um a quatro anos, além da multa.
Segundo ensina Nucci, “embora pareça desnecessário o tipo dizer que a poluição seja em níveis que possam resultar em danos à saúde humana, já que toda forma de poluição é um prejuízo natural à saúde de seres vivos, quer-se demonstrar que a conduta penalmente relevante relaciona-se com níveis insuportáveis, inclusive aptos a gerar a morte de animais e a destruição de vegetais. Há diferença entre seres humanos e animais ou plantas. Quanto a pessoas, a poluição precisa apenas ser capaz de causar danos à saúde; em relação a animais ou vegetais, é fundamental chegar à mortandade ou destruição” (Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017).
Diante disso, chega-se à conclusão de que o crime tipificado no art. 54 pode ser tanto formal quanto material, a depender da forma da poluição: para que se caracterize contra a fauna e a flora, pressupõe-se o resultado naturalístico, ao passo que, contra humanos, basta a potencialidade de danos à saúde.
De qualquer forma, o ato de causar poluição deixa vestígios, o que nos leva à indagação a respeito da necessidade de que se realize exame de corpo de delito.
Sabemos que, nos termos do disposto no art. 158 do CPP, “Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”. Corpo de delito, na definição simples mas precisa de João Mendes, “é o conjunto de elementos sensíveis do fato criminoso” (O processo criminal brasileiro, 1.911, vol. 2, p. 6). É, assim, o cadáver do ofendido; é o produto impróprio disponibilizado para consumo; ou, ainda, o ambiente atingido pela poluição provocada pela ação humana. O exame se constitui, portanto, na perícia elaborada sobre o corpo de delito para que se delineiem, no processo, a forma e as circunstâncias da ocorrência do crime.
Embora seja defensável a exigência do exame de corpo de delito em qualquer caso envolvendo o crime de poluição, a Terceira Seção do STJ dirimiu controvérsia antes instaurada e estabeleceu a orientação de que a primeira parte do art. 54 da Lei 9.605/98 – que trata da poluição com potencialidade de danos à saúde humana – dispensa a realização da perícia, porque se trata de crime formal:
“Cinge-se a controvérsia a saber se é necessária a realização de perícia técnica para a comprovação do dano efetivo à saúde humana no que tange à caracterização de crime ambiental consubstanciado em causar poluição de qualquer natureza. Quanto ao ponto, o acórdão embargado entendeu que “o delito previsto na primeira parte do art. 54 da Lei n. 9.605/1998 exige prova do risco de dano, sendo insuficiente para configurar a conduta delitiva a mera potencialidade de dano à saúde humana”. Já para o acórdão paradigma, “o delito previsto na primeira parte do artigo 54, da Lei n. 9.605/1998, possui natureza formal, porquanto o risco, a potencialidade de dano à saúde humana, é suficiente para configurar a conduta delitiva, não se exigindo, portanto, resultado naturalístico e, consequentemente, a realização de perícia” (AgRg no REsp 1.418.795-SC, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellize, Rel. para acórdão Regina Helena Costa, Quinta Turma, DJe 7/8/2014). Deve prevalecer o entendimento do acórdão paradigma e nos casos em que forem reconhecidas a autoria e a materialidade da conduta descrita no art. 54, § 2º, V, da Lei n. 9.605/1998, a potencialidade de dano à saúde humana é suficiente para configuração da conduta delitiva, haja vista a natureza formal do crime, não se exigindo, portanto, a realização de perícia” (EREsp 1.417.279/SC, j. 11/04/2018).
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