Tramita no Supremo Tribunal Federal inquérito deflagrado com o fito de investigar práticas delitivas supostamente cometidas por Sua Excelência, o Presidente da República (INQ 4483).
Após ordenar o início do apuratório (iniciado a pedido do Procurador Geral da República), o Ministro relator determinou encaminhamento do feito à Polícia Federal para materialização de diligências aptas a elucidar os fatos.
Depois de contato feito pela Polícia Federal, para que fosse marcado dia, hora e local para oitiva do Presidente da República, os advogados do investigado peticionaram ao Ministro relator, requerendo: “que se o Presidente da República for ouvido deverá sê-lo em ato presidido por Vossa Excelência ou responder por escrito quesitos adredemente elaborados”.
A necessidade da oitiva do chefe do Executivo Federal foi ratificada por pedido do Procurador Geral da República.
O Ministro Edson Fachin, relator do inquérito, determinou a materialização da oitiva, mediante expedição de ofício pela Autoridade Policial ao investigado, com as perguntas que o Delegado de Polícia Federal entender pertinentes ao esclarecimento dos fatos, podendo o Presidente da República responder aos questionamentos também por escrito.
Nesta toada, cumpre analisar o artigo 221, § 1º, do Código de Processo Penal, que permite ao Presidente da República, caso queira, prestar depoimento por escrito:
Art. 221. (…)
- 1º. O Presidente e o Vice-Presidente da República, os presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal poderão optar pela prestação de depoimento por escrito, caso em que as perguntas, formuladas pelas partes e deferidas pelo juiz, Ihes serão transmitidas por ofício (grifos meus).
Ocorre que tal prerrogativa é conferida ao chefe do Executivo Federal (e a outras poucas autoridades) apenas quando o mesmo figura no inquérito ou no processo como testemunha. É o que revela a análise da posição tópica do artigo 221, no bojo do Código de Processo Penal (ele foi incrustrado no Capítulo VI do CPP, que trata da prova testemunhal).
No presente caso prático (INQ 4483), o Presidente da República figura no feito como investigado e não como testemunha (sua oitiva certamente será materializada em termo de declarações e não em termo de depoimento, sendo-lhe oportunizados todos os direitos inerentes a sua condição de investigado – silêncio, não autoincriminação, ser assistido, caso deseje, por advogado, dentre outros).
Penso que não há como interpretar extensivamente a prerrogativa outorgada no supramencionado artigo 221, § 1º, do CPP. Caso o legislador desejasse conferir tal deferência às mesmas autoridades mencionadas no dispositivo, quando figurassem como investigadas/acusadas, deveria repetir texto idêntico no Capítulo III do CPP – que trata do interrogatório do acusado. Não o fez.
Por derradeiro, é importante que se diga que a permissão em testilha (assentir que o investigado responda perguntas outrora confeccionadas, por escrito) limita a diligência investigativa, vez que a oitiva presencial é ato dinâmico, que oportuniza a materialização de questionamentos outros, além dos inicialmente imaginados pela autoridade que preside o ato, a depender das respostas dadas pelo investigado (caso o mesmo opte por responder, já que tem direito ao silêncio).
Destarte, com a maxima venia, forte nas breves razões listadas supra, cumpre discordar da posição manifestada por Sua Excelência o Ministro Edson Fachin, relator do INQ 4483, quando permitiu ao Presidente da República, na condição de investigado, prestar declarações por escrito, via ofício.
Não perca:
Para se aprofundar:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E LEI DE EXECUÇÃO PENAL COMENTADOS POR ARTIGOS (2017)