O interrogatório é disciplinado no art. 185 do Código de Processo Penal e consiste na resposta dada pelo acusado às perguntas que lhe são formuladas para esclarecimento do fato delituoso e suas circunstâncias. Reveste-se de enorme importância – Vicente de Azevedo o considerou “a peça mais importante do processo penal” (RT 133/636) – já que consiste na única oportunidade em que o réu, de viva voz, no exercício de sua autodefesa, pode apresentar sua versão dos fatos ao Juiz, ou seja, é o único momento processual em que ocorre uma audiência entre acusado e julgador.
Nos termos extraídos do art. 185, nota-se que o interrogatório pode ser efetuado: a) mediante comparecimento do acusado perante a autoridade (caput); b) no caso de réu preso, em sala própria localizada no estabelecimento prisional (§ 1º); c) excepcionalmente, por videoconferência (§ 2º). Na prática, a regra é de que o acusado compareça perante o magistrado, mesmo nos casos em que esteja preso cautelarmente. Não obstante o texto expresso do § 1º do art. 185, que impõe o interrogatório do preso no próprio estabelecimento prisional para evitar os riscos da fuga e todos os transtornos que envolvem o transporte – que necessita de viaturas e agentes deslocados somente para aquele ato –, os interrogatórios são em franca maioria realizados nos fóruns.
Por sua vez, o interrogatório por meio eletrônico, como já apontamos, é excepcional e deve ser fundamentado em uma das situações elencadas no § 2º do art. 185:
I – prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento;
II – viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III – impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código;
IV – responder à gravíssima questão de ordem pública.
Dentre as possibilidades, destacamos a do inciso III, que permite o interrogatório por videoconferência se a presença do réu puder causar alteração de ânimo na vítima ou em testemunhas.
Reza o art. 217 do CPP que na hipótese em que a presença do réu “causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento”, essa prova será colhida por videoconferência. Caso não seja possível a utilização desse instrumento, o juiz determinará “a retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor” (vê-se que se trata de dispositivo altamente favorável ao acusado, ao permitir que ele acompanhe a audiência por videoconferência, o que não ocorreria caso fosse simplesmente retirado da sala).
O dispositivo em exame (art. 185, § 2º, III), por seu turno, autoriza o interrogatório por videoconferência desde que preenchidos dois requisitos: primeiro, que a presença do réu influa no ânimo da testemunha ou vítima e, segundo, que tais depoimentos não possam ser colhidos por videoconferência.
Com fundamento nesta disposição legal, o STJ concedeu apenas parcialmente a ordem – para ajustar a pena – no HC 279.530/SP (j. 12/12/2017), no qual a Defensoria Pública de São Paulo pretendia ver reconhecida a ilegalidade de interrogatório realizado por videoconferência, determinado em razão do temor que a presença do acusado causava na vítima.
A Defensoria alegou que a situação não se enquadrava em nenhuma das permissões do § 2º do art. 185; que não havia sido comprovada a possibilidade de a vítima ser influenciada pela presença do acusado; e que a oitiva da própria vítima poderia ter sido feita por meio de videoconferência ou, ainda, poderia o acusado ter sido retirado da sala de audiências.
A ilegalidade do interrogatório já havia sido afastada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que considerou atendidos os requisitos do § 2º do art. 185 diante das peculiaridades do caso concreto. E, na mesma esteira, concluiu o STJ que, “Evidenciado o temor da vítima em prestar suas declarações na frente do acusado, não enseja ilegalidade a ser sanada, pois o interrogatório teria sido realizado de acordo com o disposto no art. 185, § 2º, III, do Código de Processo Penal”.
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