Informativo: 657 do STJ – Processo Penal
Resumo: Reeducando, em prisão domiciliar, pode ser autorizado a se ausentar de sua residência para frequentar culto religioso no período noturno.
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O sistema de execução penal brasileiro é baseado na possibilidade de progressão de regime, consistente na execução da reprimenda privativa de liberdade de forma a permitir a transferência do condenado para regime menos rigoroso, desde que cumpridos determinados requisitos. Desta forma se privilegia a finalidade reeducativa (ressocializadora) da pena.
A regra é de que a progressão não pode ser concedida em saltos, ou seja, do regime fechado diretamente para o aberto, pois cada regime tem características específicas que, a seu modo, podem contribuir para a gradativa recuperação do condenado.
Ocorre que a estrutura física do sistema de execução penal brasileiro nem sempre permite que a progressão ocorra no tempo certo para o estabelecimento adequado. Noutras palavras, é comum que o preso em regime fechado cumpra a fração necessária para progredir ao semiaberto, mas não haja vaga em unidade prisional característica deste regime de pena.
O preso nesta situação não pode permanecer no regime mais rigoroso até que surja a vaga no estabelecimento penal apropriado. Há inclusive súmula vinculante (56) que o proíbe.
Uma das medidas que podem ser tomadas para contornar o problema é a concessão de prisão domiciliar. Não obstante a jurisprudência dos tribunais superiores a tratem como uma medida de caráter excepcional, é possível, a depender das circunstâncias, que o condenado cuja execução penal esteja na fase do regime semiaberto seja posto em prisão domiciliar com monitoramento eletrônico e com a observância de algumas das características do regime intermediário, como a possibilidade de trabalho externo e o recolhimento noturno em horário determinado.
Este cenário pode levar a situações que normalmente não ocorreriam se a pena estivesse sendo cumprida em estabelecimento penal próprio do regime semiaberto. Uma destas situações foi julgada recentemente pelo STJ e diz respeito à flexibilização do recolhimento noturno para que o preso frequente culto religioso (REsp 1.788.562/TO, j. 17/09/2019).
No caso julgado, o juiz da execução havia negado a saída noturna sob o argumento de que a situação do condenado já era benéfica o bastante, pois, àquela altura, poderia ele estar cumprindo pena em estabelecimento penal, com mais rigor e disciplina. Conceder-lhe ainda o direito de não se submeter completamente ao recolhimento noturno seria condescendente demais. O Tribunal de Justiça manteve a decisão ao julgar o agravo em execução:
“Desta forma, deferir ao apenado o direito de frequentar os cultos religiosos, em local, dias e horários determinados, significa, suprimir a própria pena, uma vez que o reeducando já trabalha e ainda terá vida social ativa com a sua frequência a cultos em 4 (quatro) dias da semana, retirando da pena seu caráter sancionador. Por derradeiro, dificultando, ou até mesmo inviabilizando a fiscalização do cumprimento da conforme enfatizado nas contrarrazões, a autorização de frequência a cultos religiosos em 4 (quatro) dias da semana implicará a necessidade de fiscalização por parte da Central de Monitoramento Eletrônico e gerará precedente para que outros reeducandos requeiram autorização para frequentar atividades religiosas ou outras atividades que considerem ressocializadoras, dificultando, ou até mesmo inci pena. [sic]” Posto isso, verifica-se que, não há necessidade de o Acusado frequentar os cultos religiosos, tendo em vista que, seria por demais benéficos ao reeducando. No presente caso, o Agravante pode aproveitar da benesse que já foi lhe imposta, ou seja, a prisão em domicílio. Deste modo poderá adequar seus horários para o exercício de suas práticas religiosas durante o período diurno, ou até mesmo podendo assistir em sua televisão os cultos religiosos que são exibidos em vários canais abertos”.
O STJ, contudo, considerando a contribuição que a frequência a cultos religiosos pode ter para a ressocialização, e ainda em razão da possibilidade de monitorar o horário e a área percorrida, proveu o recurso especial para possibilitar que o condenado frequente o local do culto em dias e horários predeterminados:
“1. O cumprimento de prisão domiciliar não impede a liberdade de culto, quando compatível com as condições impostas ao reeducando, atendendo à finalidade ressocializadora da pena. 2. Não havendo notícia do descumprimento das condições impostas pelo juízo da execução, admite-se ao executado, em prisão domiciliar, ausentar-se de sua residência para frequentar culto religioso, no período noturno. 3. Considerada a possibilidade de controle do horário e de delimitação da área percorrida por meio do monitoramento eletrônico, o comparecimento a culto religioso não representa risco ao cumprimento da pena. 4. Recurso especial parcialmente provido para permitir ao reeducando o comparecimento a culto religioso às quintas e domingos, das 19h às 21h, mantidas as demais condições impostas pelo Juízo das Execuções Criminais”.
Para se aprofundar, recomendamos:
Livro: Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal Comentados por Artigos