Informativo: 685 do STJ – Direito Penal
Resumo: O crime de exercício arbitrário das próprias razões é formal e se consuma com o emprego do meio arbitrário, ainda que o agente não consiga satisfazer a sua pretensão
Comentários:
No exercício arbitrário das próprias razões (art. 345 do CP), o autor, a pretexto de realizar interesse próprio ou alheio, arbitrariamente emprega os meios necessários para tanto (violência, grave ameaça, fraude etc.), ignorando o monopólio estatal na administração da justiça, passando-se por juiz, decidindo de acordo com sua pretensão (pessoal, real ou familiar), que deve ser legítima (assentada em um direito) ou, ao menos, revestida de legitimidade (suposta, putativa).
A doutrina diverge sobre o momento consumativo do crime. A primeira corrente sustenta que o delito é formal, consumando-se antecipadamente, com o emprego dos meios a fim de que seja satisfeita a pretensão. Para a segunda corrente, o crime é material, exigindo, para a sua caracterização, a efetiva satisfação da pretensão (Nélson HungriaComentários ao Código Penal. Rio de Janeiro, v. 9 (1959), p. 49.; Heleno FragosoLições de direito penal: parte especial. São Paulo: José Bushatsky, v. 4 (1959), p. 1031.; MirabeteManual de direito penal, v. 3, p. 418.).
NoronhaDireito penal, v. 4, p. 401., adepto da primeira orientação, assim se justifica:
“Discordamos dos eminentes Profs. Nélson Hungria e Heleno C. Fragoso, ao sustentarem ponto de vista contrário: consuma-se com a satisfação da pretensão. A oração do Código não comporta esse entendimento: tal satisfação é o escopo ou fim do agente, constituindo o dolo específico; não necessita ser alcançado. Completa-se o crime com o emprego ou uso do meio arbitrário com o fim de satisfazer uma pretensão”.
O STJ decidiu no mesmo sentido:
“No caso em análise, pretende-se a desclassificação do crime de exercício arbitrário das próprias razões para a modalidade tentada.
O delito de exercício arbitrário das próprias razões, previsto no Código Penal, está assim tipificado: “Art. 345 – Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único – Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.”
Embora haja controvérsia doutrinária acerca da natureza formal ou material do delito, com abalizados autores defendendo cada uma das posições, filia-se à corrente que defende o primeiro entendimento.
Pela interpretação da elementar “para satisfazer“, conclui-se ser suficiente, para a consumação do crime do art. 345 do Código Penal, que os atos que buscaram fazer justiça com as próprias mãos tenham visado obter a pretensão, mas não é necessário que o agente tenha conseguido efetivamente satisfazê-la, por meio da conduta arbitrária. A satisfação, se ocorrer, constitui mero exaurimento da conduta.
Sendo assim, por se tratar de crime formal, uma vez praticados todos os atos executórios, consumou-se o delito, a despeito de o autor da conduta não ter logrado êxito em sua pretensão, que, no caso, era a de pegar o celular de propriedade da vítima, a fim de satisfazer dívida que esta possuía com ele” (REsp 1.860.791, j. 09/02/2021).
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