O art. 537, § 1º, do CPC, prevê que “o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: se tornou insuficiente ou excessiva; o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.”
Percebe-se que o Código permite a modificação da “multa vincenda”, não a vencida. Assim, parte da doutrina compreende que não poderia haver a alteração das multas já consolidadas.
Para Fabiano Carvalho, contudo,
“Na versão do Projeto da Câmara dos Deputados (redação final aprovada em 26.03.2014) havia a previsão de que o juiz poderia, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou excluí-la, “sem eficácia retroativa”, o que contrariava boa parte da jurisprudência que sempre sustentou a inexistência de coisa julgada ou preclusão da decisão que fixa pena pecuniária. No Senado Federal, no entanto, a proposta da Câmara não vingou e o fato é que NCPC silenciou sob a eficácia da decisão que modifica ou excluiu a multa já incidiu.” (Comentários ao Novo Código de Processo Civil. São Paulo: Forense, 2016, p. 873)
Segundo Guilherme Rizzo Amaral, ao revés, “a modificação do valor unitário ou da periocidade da multa não pode se dar retroativamente. Assim, a insuficiência ou excesso do valor unitário da multa vincenda somente pode ser revisado para o futuro. Caso se verifique o excesso de multa que já incidiu, a hipótese é de supressão (ou de exclusão, como prevê o § 1º), e não de modificação do valor da periodicidade.” (Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2016, p. 1564).
Apesar disso, o STJ, na vigência do CPC/73 e, ainda atualmente, entende que se o valor da multa se tornar irrisório, exorbitante ou desnecessário, pode ser modificado ou até suprimido, ainda que de ofício, mesmo que o processo já esteja na fase de execução.
O Tribunal entende que “o art. 537, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015 não se restringe somente à multa vincenda, pois, enquanto houver discussão acerca do montante a ser pago a título da multa cominatória, não há falar em multa vencida.” (AgInt no REsp 1846190/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 20/04/2020, DJe 27/04/2020; AgInt no AREsp 1625951/SE, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 10/08/2020, DJe 26/08/2020; AgInt no AREsp 1662967/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 14/09/2020, DJe 22/09/2020.
Compreende-se que a decisão que fixa multa cominatória não preclui nem faz coisa julgada material, podendo ser revista a qualquer tempo – vide AgInt no REsp 1846156/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 14/09/2020, DJe 21/09/2020.
Por existir forte celeuma acerca do assunto, o tema voltou a ser debatido na Corte Especial do STJ nos EAREsp 650.536/RJ, julgamento iniciado em 07/10/2020.
Até aqui, o relator, Ministro Raul Araújo, e o Ministro Luís Felipe Salomão votaram por manter o entendimento tradicional do Tribunal, ou seja: as multas podem ser revistas de ofício e a qualquer tempo.
No caso analisado, o relator restabeleceu a sentença para reduzir a multa de R$ 730.000 (setecentos e trinta mil reais) para R$ 100.000,00 (cem mil reais). O Ministro Herman Benjamin pediu vista.
Devemos acompanhar esse importante tema.
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