A Lei 8.069/90 tipifica diversas condutas relativas à produção, ao trânsito e ao armazenamento de imagens pornográficas e de sexo explícito envolvendo crianças e adolescentes.
Embora os meios eletrônicos não sejam a única forma de cometer tais crimes, trata-se certamente da forma mais comum, especialmente em virtude da enorme expansão do uso da rede mundial de computadores. Há, dessa forma, situações em que o menor registra a si mesmo e transmite as imagens em tempo real, ou em que transmite suas fotografias. Há também situações em que o agente, tendo imagens em sua posse, transmite-as a outras pessoas localizadas nos mais diversos locais do mundo.
As variações das formas pelas quais os crimes são cometidos podem trazer dúvidas a respeito da competência para julgamento. Se alguém registra pessoalmente, em sua residência, imagens de sexo explícito com um menor, e as armazena ali mesmo, tudo indica que a competência para julgamento é da Justiça Estadual. Se, no entanto, são utilizados meios eletrônicos, surge a dúvida: compete à Justiça Estadual ou à Federal processar e julgar a ação penal? O impasse se deve ao fato de que a utilização de meios eletrônicos potencializa a transnacionalidade dos delitos.
De acordo com o STF, o julgamento dos crimes tipificados nos arts. 241, 241-A e 241-B da Lei nº 8.069/90 é de competência da Justiça Federal quando tais delitos forem cometidos por meio da rede mundial de computadores e: a) o fato esteja previsto como crime no Brasil e no estrangeiro; b) o Brasil seja signatário de convenção ou tratado internacional por meio do qual assume o compromisso de reprimir criminalmente aquela espécie delitiva; e c) a conduta tenha ao menos se iniciado no Brasil e o resultado tenha ocorrido, ou devesse ter ocorrido no exterior, ou reciprocamente. Assim ocorre porque se trata da situação em que, nos termos do art. 109, inciso V, da Constituição Federal, aos juízes federais compete processar e julgar os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente (RE 628.624/MG, DJe 09/11/2015).
Explicitando a disciplina da competência para julgamento (e referindo-se, no caso concreto, ao art. 241-A), o STJ já decidiu, por meio de sua Terceira Seção, que a competência da Justiça Federal se impõe quando constatada a internacionalidade do delito. Caso contrário, a competência é da Justiça Estadual (CC 150.564/MG, DJe 02/05/2017).
Em decisão recente (CC 158.642/MG, j. 27/06/2018), o tribunal reiterou a orientação ao decidir que compete à Justiça Estadual julgar ação penal em que uma adolescente havia transmitido fotos suas a um indivíduo por meio do aplicativo WhatsAPP.
Naquele caso, o juiz estadual declinou da competência argumentando que o crime apurado extrapola limites territoriais e o conteúdo transmitido se encontra disponível para acesso universal.
A Justiça Federal, por sua vez, suscitou o conflito de competência fundamentando-se no fato de que, “no caso concreto, a troca de imagens foi mantida em ambiente fechado, entre dois particulares no WhatsApp, não tendo, assim, sido preenchido o requisito da transnacionalidade que define a competência da Justiça Federal”.
O ministro Reynaldo Soares da Fonseca deu razão ao juízo suscitante do conflito.
Para o ministro, para que se considere presente a transnacionalidade necessária para atrair a competência da Justiça Federal, é imprescindível a demonstração de que as imagens de pornografia infantil foram publicadas ou divulgadas na internet, quando são alcançados destinatários em outros países. No caso julgado, como não havia indícios de que as imagens transmitidas pela adolescente saíram da esfera privada, a competência se estabeleceu na Justiça Estadual mineira.
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