O art. 59 do Código Penal estabelece diversas circunstâncias que o juiz deve analisar na primeira fase de aplicação da pena, quando impõe a pena-base. Partindo dos patamares abstratamente cominados para o crime – em sua forma simples ou qualificada –, o juiz considera fatores importantes para a individualização da pena. Cada um tem seu fundamento e deve ser utilizado de acordo com ele. Em síntese, as circunstâncias e suas características são as seguintes:
- Culpabilidade: corresponde ao maior ou menor grau de reprovabilidade da conduta do agente.
- Antecedentes: representa a vida pregressa do agente, sua vida antes do crime. Trata-se das condenações definitivas que não caracterizam a agravante da reincidência.
- Conduta social: trata-se do comportamento do réu no seu ambiente familiar, de trabalho e na convivência com os outros. Segundo o STJ, não é possível utilizar condenações passadas (REsp 1.760.972/MG, j. 08/11/2018).
- Personalidade do agente: cuida-se, aqui, do retrato psíquico do delinquente. De maneira precisa, pontuou o Superior Tribunal de Justiça que: “A circunstância judicial referente à ‘personalidade do agente’ não pode ser valorada de forma imprecisa ou objetivamente desamparada porquanto, através de considerações vagas e insuscetíveis de controle, a sua utilização acarretaria a ampla e inadequada incidência do Direito Penal do Autor” (REsp 513.64, DJ 01/07/2004).
- Motivos do crime: correspondem ao “porquê” da prática da infração penal. Entende-se que esta circunstância judicial só pode ser analisada se os motivos não integram a própria tipificação da conduta ou não caracterizam circunstância qualificadora ou agravante, sob pena de bis in idem.
- Circunstâncias do crime: exigem do magistrado a análise da maior ou menor gravidade do crime espelhada pelo modus operandi do agente.
- Consequências do crime: são os efeitos decorrentes da infração penal, seus resultados, particularmente para a vítima, para sua família ou para a coletividade.
- Comportamento da vítima: a culpa concorrente da vítima não elide, não compensa a culpa do agente, mas pode atenuar sua responsabilidade.
Sempre que aumentar a pena se baseando em alguma circunstância do art. 59, é imprescindível que o juiz demonstre concretamente as razões de sua decisão. Não é suficiente que simplesmente se refira à denominação da circunstância, pois referências genéricas impedem que se diferenciem as situações mais graves daquelas inerentes ao tipo penal e que já são consideradas pelo legislador para a cominação da pena abstrata.
Mas e no caso em que o juiz faz referência aos fatos sem mencionar correta ou expressamente a circunstância judicial tal como denominada no art. 59 do Código Penal? Há ilegalidade?
Segundo decidiu o STJ no HC 501.144/SP (j. 10/03/2020), não há nada a reparar na sentença que, não obstante tenha deixado de nominar a circunstância judicial, fez referência ao fato que justifica o aumento da pena. E, mesmo no caso em que se trate menção errônea de alguma das circunstâncias, basta que se faça a correção, sem redução da pena:
“1. A Terceira Seção fixou o entendimento de que “condenações criminais do réu transitadas em julgado e não utilizadas para caracterizar a reincidência somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais” (EREsp n. 1.688.077/MS, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, 3ª S., DJe 28/8/2019).
2. Se existe uma circunstância judicial específica destinada à valoração do passado desabonador do réu (antecedentes), revela-se uma imprecisão intitulá-la de personalidade ou de conduta social negativas.
3. Todavia, não se pode perder de vista que a dicção legal não impõe ao julgador a obrigatoriedade de nomear as circunstâncias legais. O que é cogente na tarefa individualizadora da pena-base é indicar peculiaridades concretas dos autos, relacionadas às oito vetoriais do art. 59 do CP. Se a sentença mencionar várias condenações definitivas anteriores do réu para aumentar a sanção básica, sem dar título algum à circunstância, não haverá vício no decisum.
4. As instâncias ordinárias mencionaram cinco condenações definitivas da paciente como justificativa para o recrudescimento da reprimenda na primeira fase da dosimetria. Entretanto, os registros não foram corretamente designados como maus antecedentes, mas sim como conduta social. O erro do pronunciamento está relacionado somente à atecnia na nomeação da circunstância legal. Assim, em habeas corpus, deve ser corrigida a palavra imprópria, para que o dado concreto levado em conta pelo juiz seja chamado de maus antecedentes.
5. A motivação da decisão (anotações criminais anteriores), que permitiu ao operador do direito expor a razão da escolha da sanção ao fato sob julgamento e possibilitou à defesa compreender e fiscalizar sua atuação, permanece hígida. O fundamento está relacionado à justa reprovação e prevenção do crime e não pode, portanto, ser desconsiderado apenas porque houve imprecisão na sua classificação, caso contrário seria conferido à ré, em igual intensidade, a mesma retribuição cabível aos agentes neófitos em práticas ilícitas, o que afrontaria o princípio da igualdade”.
Para se aprofundar, recomendamos:
Livro: Manual de Direito Penal (parte geral)
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