As condenações pretéritas podem influenciar de duas maneiras a aplicação da pena pelo cometimento de um novo crime: na pena-base, podem servir para justificar o aumento em virtude dos maus antecedentes; na segunda fase, podem incidir na qualidade de agravantes pela reincidênciaHá quem sustente que a agravante da reincidência é bis in idem, pois majora a pena considerando um fato passado em razão do qual o agente já foi condenado. Mas o STF, julgando o RE 453.000, considerou constitucional o instituto..
Como dispõe o art. 63 do Código Penal, “Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior”. Tal dispositivo deve ser complementado pelo artigo 7º da Lei Contravenções Penais, segundo o qual “Verifica-se a reincidência quando o agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado, no Brasil ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção”.
O Brasil adotou o sistema da temporariedade da reincidência. Dispõe o art. 64, I, do CP que “não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação”. Dessa forma, se alguém comete outra infração penal após o decurso de cinco anos da extinção ou do cumprimento da pena anterior não é mais possível fazer incidir a agravante da reincidência na segunda fase de aplicação da pena.
Mas, neste caso, a condenação anterior é simplesmente ignorada ou pode servir como maus antecedentes?
Como já adiantamos, para além da reincidência as condenações anteriores podem servir para aumentar a pena na primeira fase de aplicação, quando são analisadas as circunstâncias judiciais.
Os antecedentes são uma circunstância judicial que representa a vida pregressa do indivíduo, sua vida antes do crime. Firmou-se o entendimento de que somente podem ser valoradas como maus antecedentes as condenações definitivasÉ sumulado o entendimento do STJ no sentido de que inquéritos policiais e ações penais em andamento não podem ser utilizados (súmula nº 441). que não caracterizam a agravante da reincidência (seja pelo decurso do já referido prazo de cinco anos, seja pela condenação anterior por crime militar próprio ou político, que, segundo o art. 64, II, do CP, não é considerado para efeito de reincidência). Pode ocorrer também a situação na qual existam, por exemplo, duas condenações capazes de gerar reincidência, e uma delas fundamente a agravante enquanto outra seja utilizada como mau antecedente, evitando-se assim o bis in idem.
Ultimamente, no entanto, tem ganhado força a tese de que a superação do quinquênio depurador deve afastar tanto a circunstância agravante (reincidência) quanto o aumento fundamentado na circunstância judicial (maus antecedentes), pois não se pode admitir que uma condenação anterior tenha efeitos perpétuos e contrarie o propósito, demonstrado pelo legislador nas regras da reincidência, de apagar da vida do indivíduo as faltas passadas. A 2ª Turma do STF tem decisões nesse sentido:
“Nos termos da jurisprudência desta Segunda Turma, condenações pretéritas não podem ser valoradas como maus antecedentes quando o paciente, nos termos do art. 64, I, do Código Penal, não puder mais ser considerado reincidente. Precedentes. II – Parâmetro temporal que decorre da aplicação do art. 5°, XLVI e XLVII, b, da Constituição Federal de 1988. III – Ordem concedida para determinar ao Juízo da origem que afaste o aumento da pena decorrente de condenação pretérita alcançada pelo período depurador de 5 anos (HC 142.371/SC, j. 30/05/2017)”.
No âmbito do STJ, por outro lado, a jurisprudência das duas Turmas com competência criminal é francamente favorável à possibilidade de considerar como maus antecedentes as condenações que não mais caracterizam a reincidência:
“2. De acordo com a jurisprudência desta Eg. Corte, condenações atingidas pelo período depurador de 5 anos, previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, embora afastem os efeitos da reincidência, não impedem a configuração dos maus antecedentes. 3. No caso, o agravante possui maus antecedentes, razão pela qual, acertadamente, a pena-base foi fixada acima do mínimo legal e afastada a incidência da causa de diminuição do art. 33, §4º, da Lei de Drogas” (AgRg no Ag no REsp 1.864.887/SP, Quinta Turma, j. 23/06/2020).
“Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, condenações pretéritas com trânsito em julgado, alcançadas pelo prazo depurador de 5 (cinco) anos previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, embora afastem os efeitos da reincidência, não impedem a configuração de maus antecedentes” (AgRg no REsp 1.819.128/SP, Sexta Turma, j. 30/06/2020).
Em virtude da relevância do tema e da controvérsia que o cerca, o STF reconheceu a repercussão geral no RE 593.818 RG/SC, julgado pelo plenário em 17/08/2020. Por maioria, o tribunal firmou a seguinte tese:
“Não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal”.
Para se aprofundar, recomendamos:
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