Informativo: 666 do STJ – Direito Penal
Resumo: O grande interesse por material que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente é ínsito ao crime descrito no art. 241-A da Lei n. 8.069/1990, não sendo justificável a exasperação da pena-base a título de conduta social ou personalidade.
Comentários:
A primeira etapa de aplicação da pena privativa de liberdade tem por finalidade fixar a pena-base, partindo do preceito secundário simples ou qualificado cominado no tipo penal, sobre o qual incidirão as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime, bem como o comportamento da vítima.
Cada uma destas circunstâncias é baseada em aspectos distintos que envolvem o crime e seu autor. O aumento da pena nessa primeira fase é justificável apenas nas situações em que as circunstâncias revelam uma gravidade maior do que o normal. Por alguma das razões elencadas no art. 59, o fato é mais grave do que o legislador anteviu ao cominar os limites da pena. Por exemplo, já se decidiu que o policial que comete crime de concussão tem maior culpabilidade (leia-se: sua conduta é mais reprovável) do que um funcionário público comum que comete o mesmo crime, tendo em vista que, pela função desempenhada, espera-se que a população possa confiar mais em policiais do que em outros agentes públicos (STJ, AgRg no REsp 1.366.683/PR, j. 14/11/2017). Há também decisão que, devido aos severos danos psicológicos suportados pela vítima de estupros em continuidade, considerou legítimo o aumento da pena em razão das consequências do crime (STJ, HC 454.044/RJ, j. 04/09/2018). Ambos os exemplos revelam circunstâncias que exorbitam as elementares dos crimes. A condição de funcionário público na concussão e o abalo psicológico no estupro já são considerados na própria composição do tipo, mas há situações excepcionais que tornam mais graves essas circunstâncias.
No julgamento do REsp 1.579.578/PR (j. 04/02/2020), relativo a crimes de armazenar e compartilhar material com pornografia infantil, o STJ descartou o aumento da pena-base em razão da personalidade ou da conduta social de um condenado que, segundo o apurado, demonstrava “grande interesse” pelo material apreendido em seu poder. Para o tribunal, ainda que exacerbado, o interesse do agente por imagens ou vídeos de crianças e adolescentes em cenas pornográficas é inerente às figuras criminosas do ECA, razão pela qual já é considerado na cominação da pena abstrata:
“Cinge-se a controvérsia a decidir se o grande interesse em pornografia infantil é motivo idôneo para valorar negativamente a pena-base do réu, a título de conduta social ou personalidade do agente que cometeu o crime do art. 241-A da Lei n. 8.069/1990.
Caracteriza o crime do art. 241-A do ECA oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente (pena de 3 a 6 de reclusão e multa).
Nesse contexto, o dado inerente ao tipo penal não justifica a exasperação da pena-base, a título de conduta social ou personalidade. O grande interesse por material que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente é ínsito ao crime descrito no art. 241-A da Lei n. 8.069/1999. O referido dado já foi sopesado pelo legislador para criminalizar a conduta e estabelecer severa sanção penal, com o objetivo, justamente, de proteger a dignidade das crianças e dos adolescentes, pondo-os a salvo de formas desviadas de satisfação sexual”.
Para se aprofundar, recomendamos:
Livro: Manual de Direito Penal (parte geral)
Livro: Leis Penais Especiais – Comentadas artigo por artigo
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